quinta-feira, 30 de julho de 2009

Prece Indígena

Um homem sussurrou:
Deus, fale comigo...
E um rouxinol começou a cantar, mas o homem não ouviu.
Então o homem repetiu:
Deus, fale comigo!
E um trovão ecoou nos céus, mas o homem foi incapaz de ouvir.
incapaz de ouvir.
O Homem olhou em volta e disse:
Deus deixe-me vê-lo...
E uma estrela brilhou no céu, mas o homem não a notou.
O homem começou a gritar:
Deus, mostre-me um milagre!
E uma criança nasceu, mas o homem não sentiu o pulsar da vida.
Então o homem começou a chorar e a se desesperar:
Deus, toque-me e deixe-me sentir que você está aqui comigo...
E uma borboleta pousou suavemente em seu ombro
O homem espantou a borboleta com a mão e desiludido
Continuou o seu caminho triste, sozinho e com medo.


terça-feira, 28 de julho de 2009

Ilusão Perdida

Florida ilusão que em mim deixaste

a lentidão duma inquietude

vibrando em meu sentir tu juntaste

todos os sonhos da minha juventude.

Depois dum amargor tu afastaste-te,

e a princípio não percebi. Tu partiras

tal como chegaste uma tarde

para alentar meu coração mergulhado

na profundidade dum desencanto.

Depois perfumaste-te com meu pranto,

fiz-te doçura do meu coração,

agora tens aridez de nó,

um novo desencanto, árvore nua

que amanhã se tornará germinação.

- Fernando Pessoa –

(Ilustração: Al Pacino in ‘The Godfather’)

segunda-feira, 27 de julho de 2009

Amigos...

Eu talvez não tenha muitos amigos.

Mas os que eu tenho são os melhores

que alguém poderia ter.

Além disso tenho sorte,

porque os amigos que tenho

têm muitos amigos e os dividem comigo.

Assim o meu número de amigos sempre aumenta,

já que eu sempre ganho amigos dos meus amigos.

Foi assim aqui,

uns eu ganhei há tempos,

outros são mais recentes.

E quem os deu não ficou sem eles,

pois a amizade pode sempre ser dividida

sem nunca diminuir ou enfraquecer.

Pelo contrário, quanto mais dividida,

mais ela aumenta.

E há mais vantagens na amizade:

é uma das poucas coisas

que não custam nada e valem muito,

embora não sejam vendáveis.

Entretanto, é preciso que se cuide

um pouco das amizades.

As mais recentes, por exemplo,

precisam de alguns cuidados

Poucos, é verdade, mas indispensáveis.

É preciso mantê-los com um certo calor

falar com eles mais amiúde e no início,

com muito jeito.

Com o tempo eles crescem,

ficam fortes e até suportam alguns trancos.

Os mais antigos, já sólidos, não exigem muito,

são como as mudas das plantas,

que depois de enraizadas,

parecem poder viver sem cuidados,

porém não podem jamais ser esquecidas.

Algo é preciso para mantê-las vivas.

Prezo muito minhas amizades e

reservo sempre um canto no

meu peito para elas.

E, sempre que surge a ocasião,

também não perco a oportunidade

de dar um amigo a um amigo,

da mesma forma que eu ganhei vocês.

E não adiantam as despedidas.

De um amigo ninguém se livra fácil.

A amizade além de contagiosa

é totalmente incurável.

- Vinícius de Moraes –

(Ilustração: Warren Beatty)

Atritos

Do atrito de duas pedras chispam faíscas;
das faíscas vem o fogo; do fogo brota a luz.

- Victor Hugo -

Ninguém muda ninguém;
ninguém muda sozinho;
nós mudamos nos encontros.
Simples, mas profundo, preciso.
É nos relacionamentos que nos transformamos.

Somos transformados a partir dos encontros,
desde que estejamos abertos e livres
para sermos impactados pela idéia e sentimento do outro.

Você já viu a diferença que há
entre as pedras que estão na nascente de um rio,
e as pedras que estão em sua foz?
As pedras na nascente são toscas,
pontiagudas, cheias de arestas.

À medida que elas vão sendo carregadas pelo rio
sofrendo a ação da água e se atritando com as outras pedras,
ao longo de muitos anos, elas vão sendo polidas, desbastadas.

Assim também agem nossos contatos humanos.
Sem eles, a vida seria monótona, árida.
A observação mais importante é constatar que
não existem sentimentos, bons ou ruins,
sem a existência do outro, sem o seu contato.

Passar pela vida sem se permitir
um relacionamento próximo com o outro,
é não crescer, não evoluir, não se transformar.
É começar e terminar a existência
com uma forma tosca, pontiaguda, amorfa.

Quando olho para trás,
vejo que hoje carrego em meu ser
várias marcas de pessoas
extremamente importantes.
Pessoas que, no contato com elas,
me permitiram ir dando forma ao que sou,
eliminando arestas,
transformando-me em alguém melhor, mais suave,
mais harmônico, mais integrado.

Outras, sem dúvidas,
com suas ações e palavras
me criaram novas arestas,
que precisaram ser desbastadas.

Faz parte...
Reveses momentâneos
servem para o crescimento.
A isso chamamos experiência.
Penso que existe algo mais profundo,
ainda nessa análise.
Começamos a jornada da vida
como grandes pedras,
cheia de excessos.

Os seres de grande valor,
percebem que ao final da vida,
foram perdendo todos os excessos
que formavam suas arestas,
se aproximando cada vez mais de sua essência,
e ficando cada vez menores, menores, menores...

Quando finalmente aceitamos
que somos pequenos, ínfimos,
dada a compreensão da existência
e importância do outro, e principalmente da grandeza de Deus,
é que finalmente nos tornamos grandes em valor.

Já viu o tamanho do diamante polido, lapidado?
Sabemos quanto se tira de excesso para chegar ao seu âmago.

É lá que está o verdadeiro valor...
Pois, Deus fez a cada um de nós
com um âmago bem forte
e muito parecido com o diamante bruto,
constituído de muitos elementos,
mas essencialmente de amor.
Deus deu a cada um de nós essa capacidade, a de amar...
Mas temos que aprender como.

Para chegarmos a esse âmago,
temos que nos permitir,
através dos relacionamentos,
ir desbastando todos os excessos
que nos impedem de usá-lo,
de fazê-lo brilhar
Por muito tempo em minha vida acreditei
que amar significava evitar sentimentos ruins.
Não entendia que ferir e ser ferido,
ter e provocar raiva, ignorar e ser ignorado
faz parte da construção do aprendizado do amor.

Não compreendia que se aprende a amar
sentindo todos esses sentimentos contraditórios e...
os superando.

Ora, esse sentimentos simplesmente não ocorrem
se não houver envolvimento...
E envolvimento gera atrito.
Minha palavra final:
ATRITE-SE!

Não existe outra forma de descobrir o amor.
E sem ele a vida não tem significado.

- Roberto Crema –

(Ilustração: George Peppard)

domingo, 26 de julho de 2009

Ternura

Eu te peço perdão por te amar de repente

Embora o meu amor

seja uma velha canção nos teus ouvidos

Das horas que passei à sombra dos teus gestos

Bebendo em tua boca o perfume dos sorrisos

Das noites que vivi acalentando

Pela graça indizível

dos teus passos eternamente fugindo

Trago a doçura

dos que aceitam melancolicamente.

E posso te dizer

que o grande afeto que te deixo

Não traz o exaspero das lágrimas

nem a fascinação das promessas

Nem as misteriosas palavras

dos véus da alma...

É um sossego, uma unção,

um transbordamento de carícias

E só te pede que te repouses quieta,

muito quieta

E deixes que as mãos cálidas da noite

encontrem sem fatalidade

o olhar estático da aurora.

- Vinícius de Moraes

(Ilustração: Jean Arthur)

Longe Do Meu Lado

Se a paixão fosse realmente um bálsamo

O mundo não pareceria tão equivocado

Te dou carinho, respeito e um afago

Mas entenda, eu não estou apaixonado

A paixão já passou em minha vida

Foi até bom, mas ao final deu tudo errado

E agora carrego em mim

Uma dor triste, um coração cicatrizado

E olha que tentei o meu caminho

Mas tudo agora é coisa do passado

Quero respeito e sempre ter alguém

Que me entenda e sempre fique ao meu lado

Mas não, não quero estar apaixonado.

A paixão quer sangue e corações arruinados

E saudade é só mágoa por ter sido

Feito tanto estrago

E essa escravidão e essa dor

Não quero mais

Quando acreditei que tudo era um fato consumado

Veio a foice e jogou-te longe

Longe do meu lado

Não estou mais pronto para lágrimas

Podemos ficar juntos

E vivermos o futuro, não o passado

Veja o nosso mundo

Eu também sei que dizem

Que não existe amor errado

Mas entenda, não quero estar apaixonado.

- Renato Russo

(Ilustração: Jane Greer)

Só De Sacanagem!

Meu coração está aos pulos!

Quantas vezes minha esperança será posta à prova?

Por quantas provas terá ela que passar? Tudo isso que está aí no ar, malas, cuecas que voam entupidas de dinheiro, do meu, do nosso dinheiro que reservamos duramente para educar os meninos mais pobres que nós, para cuidar gratuitamente da saúde deles e dos seus pais, esse dinheiro viaja na bagagem da impunidade e eu não posso mais.

Quantas vezes, meu amigo, meu rapaz, minha confiança vai ser posta à prova?

Quantas vezes minha esperança vai esperar no cais?

É certo que tempos difíceis existem para aperfeiçoar o aprendiz, mas não é certo que a mentira dos maus brasileiros venha quebrar no nosso nariz.

Meu coração está no escuro, a luz é simples, regada ao conselho simples de meu pai, minha mãe, minha avó e os justos que os precederam: "Não roubarás", "Devolva o lápis do coleguinha", "Esse apontador não é seu, minha filha". Ao invés disso, tanta coisa nojenta e torpe tenho tido que escutar.

Até habeas corpus preventivo, coisa da qual nunca tinha visto falar e sobre a qual minha pobre lógica ainda insiste: esse é o tipo de benefício que só ao culpado interessará. Pois bem, se mexeram comigo, com a velha e fiel fé do meu povo sofrido, então agora eu vou sacanear: mais honesta ainda vou ficar.

Só de sacanagem! Dirão: "Deixa de ser boba, desde Cabral que aqui todo mundo rouba" e vou dizer: "Não importa, será esse o meu carnaval, vou confiar mais e outra vez. Eu, meu irmão, meu filho e meus amigos, vamos pagar limpo a quem a gente deve e receber limpo do nosso freguês. Com o tempo a gente consegue ser livre, ético e o escambau."

Dirão: "É inútil, todo o mundo aqui é corrupto, desde o primeiro homem que veio de Portugal". Eu direi: Não admito, minha esperança é imortal. Eu repito, ouviram? Imortal! Sei que não dá para mudar o começo mas, se a gente quiser, vai dar para mudar o final!

- Elisa Lucinda

(Ilustração: Robert Mitchum)

Tempo...

Viver é a coisa mais rara do mundo.

A maioria das pessoas apenas existe.

- Oscar Wilde -

A vida é o dever que nós trouxemos para fazer em casa.

Quando se vê, já são seis horas!

Quando de vê, já é sexta-feira!

Quando se vê, já é Natal...

Quando se vê, já terminou o ano...

Quando se vê perdemos o amor da nossa vida.

Quando se vê passaram 50 anos!

Agora é tarde demais para ser reprovado...

Se me fosse dado um dia, outra oportunidade,

eu nem olhava o relógio.

Seguiria sempre em frente

e iria jogando pelo caminho

a casca dourada e inútil das horas...

Seguraria o amor que está a minha frente

e diria que eu o amo...

E tem mais:

não deixe de fazer algo de que gosta

devido à falta de tempo.

Não deixe de ter pessoas ao seu lado

por puro medo de ser feliz.

A única falta que terá será a desse tempo que,

infelizmente, nunca mais voltará.

- Mário Quintana –

(Ilustração: Oscar Wilde)

No Ano Passado...

Já repararam como é bom dizer "o ano passado"?

É como quem já tivesse atravessado um rio,

deixando tudo na outra margem...

Tudo sim, tudo mesmo!

Porque, embora nesse "tudo" se incluam algumas ilusões,

a alma está leve, livre, numa extraordinária sensação de alívio,

como só se poderiam sentir as almas desencarnadas.

Mas no ano passado, como eu ia dizendo,

ou mais precisamente, no último dia do ano passado

deparei com um despacho da Associeted Press em que,

depois de anunciado como se comemoraria

nos diversos países da Europa a chegada do Ano Novo,

informava-se o seguinte, que bem merece um parágrafo à parte:

"Na Itália, quando soarem os sinos à meia-noite, todo mundo atirará pelas janelas as panelas velhas e os vasos rachados".

Ótimo!

O meu ímpeto, modesto mas sincero,

foi atirar-me eu próprio pela janela,

tendo apenas no bolso, à guisa de explicação para as autoridades,

um recorte do referido despacho.

Mas seria levar muito longe uma simples metáfora,

aliás praticamente irrealizável, porque resido num andar térreo.

E, por outro lado, metáforas a gente não faz para a Polícia,

que só quer saber de coisas concretas.

Metáforas são para aproveitar em versos...

Atirei-me, pois, metaforicamente, pela janela do tricentésimo-sexagésimo-quinto andar do ano passado.

Morri? Não. Ressuscitei.

Que isto da passagem de um ano para outro

é um corriqueiro fenômeno de morte e ressurreição –

morte do ano velho e sua ressurreição como ano novo,

morte da nossa vida velha para uma vida nova.

- Mário Quintana –

(Ilustração: Barbara Eden in “7 faces of Dr Lao”)

sábado, 25 de julho de 2009

Religiões... Diferenças... Intolerância... Preconceito...

Quando pratico o bem, sinto-me bem;

quando pratico o mal, sinto-me mal.

Eis a minha religião.

- Abraham Lincoln –

A religião é o suspiro da criatura oprimida,

o ânimo de um mundo sem coração

e a alma de situações sem alma.

A religião é o ópio do povo.

- Karl Marx -

Não acredite em algo simplesmente porque ouviu.

Não acredite em algo simplesmente porque todos falam a respeito.

Não acredite em algo simplesmente porque está escrito em seus livros religiosos.

Não acredite em algo só porque seus professores e mestres dizem que é verdade.

Não acredite em tradições só porque foram passadas de geração em geração.

Mas depois de muita análise e observação,

se você vê que algo concorda com a razão,

e que conduz ao bem e beneficio de todos, aceite-o e viva-o.

- Siddharta Gautama –

Hoje, enfrentamos muitos problemas.

Alguns criados por nós em conseqüência

de diferenças ideológicas, religiosas, raciais, econômicas.

Entretanto, chegou o momento de pensarmos

em um nível mais profundo, em nível humano,

e a partir daí apreciar e respeitar

essa mesma condição nos outros seres humanos.

Devemos construir relacionamentos mais próximos,

de confiança mútua, compreensão e ajuda.

Todos queremos a felicidade e evitar o sofrimento.

Todos temos o mesmo direito de ser felizes,

e aí reside a nossa igualdade fundamental.

Não é necessário seguir filosofias complicadas.

Nosso próprio cérebro, nosso próprio coração é o nosso templo.

A filosofia é a bondade.

- Dalai Lama –

Quando há uma tempestade,

a água que cai é pura.

A chuva cai em montanhas, planícies e vales.

De acordo com a região por onde a água da chuva passa,

seu nome e sua forma sofrem mudanças.

Mas, por causa dessas variações,

não se deveria pensar que a água é diferente.

Com base nos ensinamentos dos fundadores das diferentes crenças,

considerando as exigências de tempo e circunstância de determinados países,

e mantendo em vista as necessidades específicas das pessoas envolvidas,

certas regras e certos regulamentos foram estabelecidos.

Por causa disso, uma fé não deveria ser considerada superior

e outra fé considerada inferior.

O dever fundamental do homem

é ter em mente as verdades sagradas

que as crenças abraçam e as praticar em sua vida.

- Sathya Sai Baba –