quarta-feira, 25 de abril de 2012

Metade - Oswaldo Montenegro


Que a força do medo que tenho
Não me impeça de ver o que anseio
Que a morte de tudo em que acredito 
Não me tape os ouvidos e a boca 
Porque metade de mim é o que eu grito 
Mas a outra metade é silêncio
Que a música que ouço ao longe 
Seja linda ainda que tristeza 
Que a mulher que eu amo seja pra sempre amada 
Mesmo que distante 
Porque metade de mim é partida 
Mas a outra metade é saudade
Que as palavras que eu falo 
Não sejam ouvidas como prece e nem repetidas com fervor 
Apenas respeitadas 
Como a única coisa que resta 
A um homem inundado de sentimentos 
Porque metade de mim é o que ouço 
Mas a outra metade é o que calo
Que essa minha vontade de ir embora 
Se transforme na calma e na paz que eu mereço 
Que essa tensão que me corrói por dentro 
Seja um dia recompensada 
Porque metade de mim é o que eu penso, 
mas a outra metade é um vulcão
Que o medo da solidão se afaste,
e que o convívio comigo mesmo se torne ao menos suportável
Que o espelho reflita em meu rosto um doce sorriso 
Que eu me lembro ter dado na infância 
Por que metade de mim é a lembrança do que fui 
A outra metade eu não sei
Que não seja preciso mais do que uma simples alegria 
Pra me fazer aquietar o espírito 
E que o teu silêncio me fale cada vez mais 
Porque metade de mim é abrigo 
Mas a outra metade é cansaço
Que a arte nos aponte uma resposta
Mesmo que ela não saiba
E que ninguém a tente complicar
Porque é preciso simplicidade pra fazê-la florescer
Porque metade de mim é platéia
E a outra metade é canção
E que a minha loucura seja perdoada
Porque metade de mim é amor
E a outra metade também